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Portugal escolhe no domingo o próximo Presidente da República. Esta é a campanha eleitoral mais atípica de sempre.
No domingo passado, cerca de 246 mil eleitores exerceram o voto antecipado e o lamentável cenário em que decorreu o ato mostra uma incapacidade patológica do ministro da Administração Interna para assumir as suas responsabilidades. É certo que o número de inscritos foi cinco vezes superior ao que acontecera nas eleições legislativas, mas também não é menos verdade que o MAI teve um longo período para planear e preparar todo o processo.
Uma tremenda confusão. Eleitores que esperaram mais de duas e três horas para votar, dificuldades na identificação das mesas de votos e aglomerados de pessoas sem respeito pelo distanciamento social resumem a imagem de um ato que deveria ser de elevação democrática. O voto antecipado, uma forma de simplificar o exercício de um direito cívico, tornou-se, afinal, num autêntico calvário para os eleitores. Faz lembrar aquela situação em que o condutor, querendo fugir de uma fila com muito trânsito, muda de via e ainda demora mais, porque ainda há mais tráfego.
Estivéssemos num país com um Governo decente e bastariam estes acontecimentos para que dos mesmos se retirassem consequências políticas. Mas infelizmente assim não é. Confrontado com os factos, o ministro reagiu, uma vez mais, como um elefante numa loja de cristais, afirmando, “Aquilo que eu verifiquei aqui [no Barreiro] foi o respeito por todas as regras. […] Eu vejo entusiasmo naqueles quase 250 mil portugueses que se registaram para o voto antecipado, que manifestam uma alegria do voto semelhante à alegria do voto nas primeiras eleições democráticas”.
Ora, ou Barreiro foi a exceção ou o ministro é de outro país. Mas Portugal, garantem os factos, viveu um autêntico purgatório eleitoral, em que muitos eleitores, por tanta espera, acabaram por desistir de votar. Em Vila Real, filas sem fim á vista, na rua, sob 2 graus negativos, em Vila Nova de Gaia, uma espera de horas, também em fila, em Matosinhos, um mar de gente em iguais circunstâncias, em Castelo Branco, com apenas com menos de 2.000 eleitores inscritos, reinava a confusão e em Beja, uma hora era o tempo mínimo para se poder votar.
Onde todos viram aglomerados, o ministro viu a alegria do voto. Onde todos viram o caos, o ministro viu entusiasmo em participar. Onde todos viram um falhanço, o ministro viu um êxito. Numa palavra, patético. O ministro Cabrita a ver o Mundo ao contrário, no seu melhor e como só ele sabe.
O Primeiro-Ministro, por sua vez, alinhou no autismo e como sempre o faz, passou as culpas às autarquias. “O voto correu bem, com elevada taxa de participação. Quanto à forma como foi organizado, foi muito variado. Houve concelhos com uma excelente organização. Houve outros onde, manifestamente, houve uma má organização”, comentou. Isto quer dizer que António Costa fez tudo bem e o que correu mal deve-se à ação dos autarcas socialistas que lideram as câmaras de Vila Real, Vila Nova de Gaia, Matosinhos ou Beja? É isso?
Se o objetivo era contribuir para a desmobilização dos eleitores, então o Governo acertou em cheio. Mas não pode o Governo, porque é indecoroso, passar as culpas pela organização de um ato eleitoral que é da sua competência, num contexto que se previa muito exigente e num inverno rigoroso.
Só num país cor-de-rosa se poderia concluir que correu tudo às mil maravilhas. De um partido que, por tacticismo e conveniência, não tem candidato oficial às eleições presidenciais, que lava as mãos como Pilatos a cada decisão que toma, até na organização de um ato eleitoral, não poderíamos esperar mais, quando está em causa a valorização da participação cívica dos cidadãos.
Uma nota final sobre a incompetência funcional do MAI.
Em nome da imagem e da eficácia do Estado e do próprio Tribunal Constitucional, o Ministério tinha o dever de evitar que um candidato-fantasma, pudesse constar do boletim de voto e, assim, achincalhar a eleição, uma vez que apesar de ser mais uma opção de voto, na verdade será sempre um voto nulo. E era simples. A lei não poderia permitir a impressão dos boletins antes que estivessem resolvidas as irregularidades formais. O candidato entregou 11 assinaturas e eram necessárias, no mínimo, 7.500. Ora, nestas circunstâncias, a candidatura deveria ter merecido indeferimento liminar.
Na verdade, a votação do passado domingo evidenciou uma trapalhada cívica, indigna e monumental do MAI. O PSD acredita e está convicto que o “sobressalto cívico” que Costa pediu para o atual confinamento, só poderá ser uma realidade, quando o país mudar de vida e, por consequência, mudar de Governo.
Artigo publicado originalmente no Povo Livre