Últimas notícias
Há seis anos, Portugal conheceu o maior resgate de sempre, de um banco nacional, separando o que se convencionou designar, entre o banco bom e o banco mau. Era criado o Novo Banco, para viabilizar a carteira de ativos viáveis, permanecendo no Banco Espírito Santo, os designados ativos tóxicos, resultantes das imparidades e do carrossel de negócios de má gestão, dados como irrecuperáveis.
Hoje, infelizmente, face aos prejuízos e sucessivas injeções públicas de capital, corremos o risco de o próprio Novo Banco se tornar também num banco mau ou péssimo. O que é ainda mais estranho é que tudo isto se passa, uma vez mais, nas barbas do regulador, o Banco de Portugal e sem quaisquer consequências judiciais.
Por mais auditorias que se façam, por mais inquéritos parlamentares que se requeiram, as conclusões são invariavelmente as mesmas. A responsabilidade morre sempre solteira. Mas há perdas, vendas de ativos subavaliados, contratos celebrados com fundos anónimos e um número infindável de operações que deixam um infindável lastro de suspeição. No antes, durante e depois destas (in)conclusões, o prejuízo sobra sempre para os contribuintes. Quando o País reclama a falta de recursos para as áreas básicas e essenciais do Estado, esta fatura recai sempre sobre aqueles que estão cansados e fartos de salvar bancos.
Esta semana, os deputados do PSD e o presidente do Partido assinalaram o início do ano letivo, com uma visita a uma escola secundária, em Vila do Conde e, tal como esta, centenas de estabelecimentos de ensino retomam a atividade e começam o ano escolar sem orientações precisas do ministério da Educação sobre os planos de contingência, e sem saberem como devem atuar em contexto de crise pandémica. Fosse a crise financeira de um banco e o Governo já estaria a articular com o BdP mais um resgate, com a mudança do registo do Banco, a criação de um logotipo patrocinado por um a bebida qualquer e deliberar injeções de milhões de euros para, como sempre, evitar a contaminação do sistema.
Aquilo que é mais injusto e assustador, no sistema financeiro nacional, é que continuamos a pagar muito caro a má gestão do presente, sem nunca retirar lições dos erros do passado. Erros que decorrem obviamente da gestão de conselhos de administração, mas que foram ignorados por auditores e empresas de certificação de contas, omissos nas suas competências e atribuições. Suprema ironia é os bancos serem, fisicamente, os lugares mais vigiados e seguros, com sistemas de segurança dissuasores da prática criminal, quando é exatamente por dentro que alguns bancos são assaltados.
Estou certo, que o dossier explosivo do Novo Banco ainda dará muitas páginas de relatórios e manchetes de jornais. Mas, na verdade, não é justo que a democracia continue condicionada por novelos financeiros, cujas pontas se estendem desde Lisboa até aos paraísos fiscais mais recônditos da banca. “Terminou o ciclo do silêncio, iniciou-se o ciclo do esclarecimento. É absolutamente essencial que percebam que o banco tenderá a explicar todas as operações que realizou, todos os seus atos de gestão”, afirmava António Ramalho, o presidente do Novo Banco. Gostaria muito de aceitar como sinceras estas declarações, mas não acredito em qualquer esclarecimento cabal, quando o próprio Novo Banco está rodeado de cortinas de fumo. Chamem-lhe, por exemplo, o nome de auditorias, que, como muito bem lembrou Rui Rio, “são como as sondagens”. Existem com fartura e para todos os gostos.
O Novo Banco corre o risco de juntar de uma só vez, três personagens de um clássico do cinema: o bom, o mau e o vilão. O bom que, supostamente, seria o Novo Banco. O mau, que todos queriam que tivesse ficado no BES. E o vilão, que ainda não está identificado, está a tornar este épico, num episódio da vida real portuguesa. No faroeste, os culpados eram invariavelmente punidos e condenados. Em Portugal, continuam à solta e ainda se riem de nós. E infelizmente, não há nada de pedagógico neste clássico da sétima arte, só ruína, rasteira e rebaldaria.
Artigo publicado originalmente no Povo Livre