A presidência portuguesa do Conselho da União Europeia ainda agora se iniciou e já começa a dar que falar, mas infelizmente, sempre pelas piores razões. Há cerca de dois meses que o nosso Executivo representa e lidera os 27 governos da União e já sabemos onde foram gastos, ou melhor, torrados os primeiros oito milhões de euros. Ajustes diretos para aquisição de vinhos, fatos, camisas e a transformação de um espaço no CCB em centro de imprensa, em pleno tempo de distanciamento social e eventos por videoconferência (!).
O “Politico” fala em despesas insólitas e descreve o centro de imprensa como uma “cidade-fantasma”, mas pelos vistos a presidência, ela própria, poderá ser uma assombração. O Governo gastou 39.780 euros em vestuário, formal e descontraído, mais propriamente 180 fatos e 360 camisas para motoristas. Aquele site internacional diz que é inédito, numa presidência, a compra de fatos para motoristas, em contraponto com o histórico, onde era habitual a aquisição de material institucional, produtos alimentícios, suportes publicitários e equipamentos eletrónicos e digitais.
As empresas escolhidas, sem concurso, nem consulta prévia, são igualmente uma brincadeira de mau gosto, que nos expõe ao ridículo. Uma das empresas declara um capital social de dois euros (!). Nem dá para acreditar.
Ainda que não se possa aferir sobre o mérito da despesa – até porque os contratos não estão disponíveis – não se trata de uma questão de dinheiro, mas de um princípio de boa governança.
Com mais de dois milhões de pobres e com o país a atravessar a mais grave crise social das nossas vidas, constatamos que temos um governo empreendedor, criativo e muito proativo em fazer o que mais gosta e melhor sabe fazer. Cuidar das aparências e desbaratar dinheiros públicos. A verdade é que esta fatal predileção choca de frente com a realidade e é um atentado para as necessidades básicas de milhares de famílias, que recorrem dos bancos alimentares para terem uma refeição condigna.
Nada a que já não estivéssemos habituados. Um verdadeiro cliché dos governos socialistas, que combinam sempre a mesma trilogia de vícios sociais: imagem, desfaçatez e clientelismo. Defeitos que abundam no ADN do PS, não surpreendendo que António Costa queira exportar o modelo para a Europa e repetir fora de portas o banquete desse animal feroz, que prestou altos serviços à nação e nos levou à bancarrota, José Sócrates.
A presidência portuguesa fazia-se anunciar com o lema “Tempo de Agir: por uma recuperação justa, verde e digital”. Mas o prenúncio é de um autêntico forrobodó. Por este andar, esta presidência arrisca-se a ficar para a história como o semestre dos gastos à tripa-forra. O grau de incompetência é babilónico – atente-se o caso da escolha de magistrado português para procurador europeu – e um Governo que não sabe dar o exemplo, não pode exigir aos seus concidadãos que sejam cumpridores.
Portugal está, como escreveu, Eça de Queirós, “governado ao acaso, governado por vaidades e por interesses, por especulação e corrupção, por privilégio e influência de camarilha”. Infelizmente, até no poder local, conhecemos bem o lastro daqueles que, em ano de eleições, conseguem fazer à pressa aquilo que só prometeram ou que não foram capazes de fazer em três anos. O PS não olha a meios para atingir fins, que é como quem diz para se perpetuar no poder e para isso não se coíbe de continuar a alimentar as clientelas político-partidárias.
Numa altura em que se fala de uma chuva de milhões, ao abrigo dos programas de recuperação económica, nos próximos anos, é de temer que venha aí um vendaval de negócios, a replicar os gastos da quarta presidência portuguesa.
Para já, como bem retratou um cartoonista nacional, resta-nos “uma espécie de aquecimento para quando chegar o dinheiro da bazuca”. O receio é que a vitamina de António Costa não nos tire da cepa torta e ainda por cima nos mostre a incapacidade do PS de estabelecer prioridades e a habilidade inata para falhar oportunidades e objetivos.
Há muitos anos que o PS não sabe fazer outra coisa, senão brincar com coisas sérias. Neste caso, com o dinheiro dos nossos impostos.
Artigo publicado originalmente no Povo Livre